Quantas vezes o amor me tens ferido?
Quantas vezes a razão me tens curado?
Quão fácil de um estado a outro estado
O mortal sem querer é conduzido!
Tal, que em grau venerando, alto e luzido,
Como que até regia a mão do fado,
Onde o sol bem de todos, lhe é vedado
Depois com ferros vis se vê cingido:
Para que o nosso orgulho as asas corte,
Que variedade inclui esta medida,
Este intervalo da existência a morte!
Travam-se gosto, e dor;sossego e lida;
É da lei da Netureza, é lei da sorte
Que seja o mal e o bem matiz da vida.
Luzido: Verbo luzir: Vistoso, brilhante, pomposo
Cingido: verbo cingir: rodeado, cincundado
Matiz: Combinação de cores diversas num todo.
Fonte: Sonetos de Bocage- Editora Núcleo
Soneto maravilhoso de Bocage no qual ele reflete as mudanças de estados de espiríto no ser humano, associando-os com as mudanças que se processam na natureza. A instabilidade não é referência somente do ser humano, mas também da própria vida.
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